“A senhora já tem o cartão da loja?”

“A senhora já tem o cartão da loja?”

Fui até uma livraria se nenhuma intenção de comprar nada, porém, como uma pessoa compulsiva por livros que sou, me apaixonei pelo novo livro de crônicas do Antônio Prata e resolvi perguntar a quem eu estava enganando ao entrar numa livraria e achar que não compraria nenhum livro. Levei o meu mais novo xodó literário ao caixa e a mulher que estava no caixa perguntou “a senhora já tem o cartão da loja?”. SENHORA?

Com certeza não é a primeira vez que acontece, ou a primeira vez que percebo esse vocativo. Mas quando isso começou a acontecer? Quando eu me tornei senhora? Talvez a culpa seja das pessoas que no auge dos meus dezenove anos me chamam de senhora. Nada tenho de senhora, nem ao menos quero ter. Será que eu pareço uma senhora? O que aconteceu com o delicado menina? Se bem que “a menina já tem o cartão da loja?” não seria bom.

O que houve com o “moça”? Um simples “a moça já tem o cartão da loja?” seria certamente bem melhor, mas não daria toda a importância que o cartão da loja merece. Uma moça não tem cartão de lojas, só mesmo uma senhora o tem. Uma moça também não fica lendo sozinha em uma livraria. Moças tem a vida corrida, não tem tempo para isso. Mas as senhoras tem. Senhoras tem tempo para tudo - mesmo que repetidamente aleguem estar muito ocupadas.

Talvez ser senhora não seja tão ruim. Gosto mesmo de ficar por aí sozinha em livrarias, de ir sozinha ao cinema, de ficar em casa vendo novela, de alegar estar muito ocupada, de achar que não tenho mais idade para fazer as coisas, e de tomar chá. Talvez a mulher do caixa tenha lido na minha cara que independente da minha idade eu era uma senhora. Talvez eu já tenha nascido senhora.

“Não, não tenho o cartão da loja” respondi. Peguei minha sacola com o livro dentro e sai da livraria com uma ar ainda mais senhoril.

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